Pais e filhas, pais vivos e pais mortos

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  • * Júlio César de Lima Prates

Poucas pessoas me compreendem. Mas meu olhar é muito observador. Olho e examino tudo a minha frente, com cautela e com cuidado.

No dia dos pais eu escreveria uma história conjugada em duas, são duas filhas.

Todos os meios dias, quando saio para almoçar, atravesso a praça. Noto diversas pessoas que carregam seus almoços e sentam num banco, próximo a uma torneira, e ali almoçam.

Há muito tempo, sem que ela saiba que a cuido, observo uma menina que carrega sua comidinha em potinhos de plásticos e logo a seguir chega um senhor, que usa uma muleta, amparado pelo encosto côncavo, que eu imagino ser seu pai. Na precariedade de um banco de praça, admiro seu amor e seu afeto ao servir a comida ao seu pai. Ela carrega os talheres, um pano de prato e faz tudo com muito amor. Por várias vezes assisti a divisão dos alimentos e pude ver o quanto ela tem um potencial afetivo raro, pois, para mim, o ato de alimentação, é altamente sublime. Quando tinha minha casa, era o momento mais sublime, especialmente com minha minha filhinha, a quem eu amava fazer e dar-lhe comida. O destino me impôs uma perda muito grande, mas segui vivo e seguirei até quando Deus assim quiser.

Não sei o nome daquela moça, não faço a menor idéia quem seja, nada da família, e por tudo, suponho que seja uma pessoa muito pobrezinha. Mas a docilidade e a meiguice ao servir aquele pobre homem a faz rica, eu a admiro muito e o valor que ela transcende é incomensurável.

O segundo exemplo que usaria em minha narrativa foi de um outra moça, artista plástica e desenhista. Passei a ela o projeto de capa  do meu livro, em Santa Maria.

Mas ao saber detalhes dessa vida, fiquei muito perturbado. Ele perdeu o pai em 2021, de COVID. Só que ela o amava tanto que a carga comercial do dia dos pais a fez profundamente triste e machucada.

Soube os relatos da dor dela, os pormenores do seu sofrimento e angústia contínua e permanente machucadura pela morte de seu paizinho.

Assim, o exemplo da mocinha que alimenta seu pai na praça e o exemplo da designer que eu encomendei carrocinhas de latas puxadas por burros, de certa forma tocaram-me muito profundamente.

Foi bom e foi um bom alívio saber que existem meninas, ainda, que amam seus pais, que os cultuam e dedicam suas vidas a eles. Dão-lhes alimentos, amam suas presenças e vivem na singeleza a grandeza de um amor sincero. Ou choram suas faltas eternas, pois a morte do pai dessa minha amiga, que é designer e bailarina numa escola, enche  meu coração de orgulho do sentido do amor de uma filha e seu pai.

A vida é uma síntese e nossos corpos e gestos sintetizam os exemplos do amor, do desamor ou da significância da criação. Essa é dialética fabulosa do todo de uma interação


*Jornalista nacional registro nº 11.175, Registro Internacional nº 908225, Sociólogo e Advogado inscrito na Sociedade de Advogados nº 9980 OAB-RS

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