Tribunal de Justiça mantém sentença do 2º juízo da 5ª Vara da Fazenda Pública do Foro Central da Comarca de Porto Alegre em ação intentada pelo Advogado Júlio Prates, nega provimento à Apelação e manda indenizar servidor reintegrado ao Estado do Rio Grande do Sul

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Advogado Júlio Prates, sentença favorável
mantida pelo Tribunal de Justiça . Decisão foi
publicado hoje: 09/04/2021.

Poder JudiciárioTribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

3ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 – Porto Alegre/RS – CEP 90110-906

APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 5015275-41.2020.8.21.0001/RS

TIPO DE AÇÃO: Processo Administrativo Disciplinar ou Sindicância

APELANTE: ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL (RÉU)

EMENTA

APELAÇÃO CÍVEL. SERVIDOR PÚBLICO. DEMISSÃO ANULADA. REINTEGRAÇÃO AO CARGO. PAGAMENTO DE VENCIMENTOS A PARTIR DO ATO DE DEMISSÃO ATÉ A REINTEGRAÇÃO. POSSIBILIDADE.

1. Diante da nulidade do ato de demissão do servidor, mostra-se possível a indenização por danos materiais, correspondentes à sua remuneração e aos reflexos devidos no período em que ficou o servidor indevidamente afastado do serviço público, desde a data de seu afastamento até sua efetiva reintegração ao cargo.

2. O Eg. Supremo Tribunal Federal, por ocasião do julgamento do RE 482.006/MG, consagrou o entendimento de que a “redução de vencimentos de servidores públicos processados criminalmente colide com o disposto nos arts. 5º, LVII, e 37, XV, da Constituição, que abrigam, respectivamente, os princípios da presunção de inocência e da irredutibilidade de vencimentos”.

Precedentes desta Corte e dos Tribunais Superiores.

APELAÇÃO DESPROVIDA (ART. 932, INC. IV, DO CPC E ARTIGO 206, XXXIX, DO REGIMENTO INTERNO DESTE TRIBUNAL).

( … )

III – MÉRITO.

A Administração Pública e os Princípios Constitucionais

A constitucionalização do Direito Administrativo remete para o importante tema da supremacia da Constituição e a efetividade em relação aos atos praticados pela Administração Pública. Como menciona J.J. Gomes Canotilho, no Estado Constitucional, a lei constitucional não é apenas uma simples lei incluída no sistema jurídico, mas verdadeira ordenação normativa fundamental.[1] Com efeito, e a partir dos artigos 1º e 3º, CF, o exercício da competência administrativa funda-se na unidade dos princípios constitucionais para materializar o conjunto de indicações democraticamente construídas. Não é por outro motivo que Juarez Freitas afirma: “nesse horizonte, já é passada a hora de princípios e direitos fundamentais assumirem maiúsculo papel no controle substancial das relações administrativas.”[2]

Nos termos do artigo 37, “caput”, CF, a Administração Pública, sob pena de chancelar o arbítrio, submete-se sim à legalidade, compreendida no horizonte de sentido dos demais princípios e regras da Constituição, de modo a manter a integridade e coerência no exercício das competências administrativas. Trata-se da concepção segundo a qual todos os atos e disposições da Administração pública submetem-se ao Direito, devem estar conforme o Direito, cuja desconformidade configura violação do ordenamento jurídico, no entendimento de Eduardo García de Enterría.[3]

Em virtude do objetivo de reduzir práticas arbitrárias da Administração Pública adota-se hodiernamente um controle de juridicidade qualificado, em relação ao exercício das competências administrativas. Vale colacionar o entendimento de Paulo Otero sobre o tema:

“a juridicidade administrativa traduz uma legalidade mais exigente, revelando que o poder público não está apenas limitado pelo Direito que cria, encontrando-se também condicionado por normas e princípios cuja existência e respectiva força vinculativa não se encontram na disponibilidade desse mesmo poder. Neste sentido, a vinculação administrativa à lei transformou-se numa verdadeira vinculação ao Direito, registrando-se aqui o abandono de uma concepção positivista legalista configurativa da legalidade administrativa, tal como resulta do entendimento doutrinal subjacente à Constituição de Bona”[4].

Esse modo de interpretar o conjunto de regras e princípios da Administração Pública é inclusive adotado pelo próprio Supremo Tribunal Federal relativamente ao controle jurisdicional, conforme explicitado por ocasião do julgamento do Ag. Reg. em MS nº 26.849-DF, Rel. Min. Luiz Fux, j. 10.04.2014: “A rigor, nos últimos anos viu-se emergir no pensamento jurídico nacional o princípio constitucional da juridicidade, que repudia pretensas diferenças estruturais entre atos de poder, pugnando pela sua categorização segundo os diferentes graus de vinculação ao direito, definidos não apenas à luz do relato normativo incidente na hipótese, senão também a partir das capacidades institucionais dos agentes públicos envolvidos.”

No âmbito do Superior Tribunal de Justiça também adota-se o entendimento de legalidade mais aprofundada para fins de resolução dos conflitos entre cidadãos e Administração Pública, nos termos do decidido no Recurso Especial nº 1001673, Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, j. em 06.05.2008:

4. Cabe ao Poder Judiciário, no Estado Democrático de Direito, zelar, quando provocado, para que o administrador atue nos limites da juridicidade, competência que não se resume ao exame dos aspectos formais do ato, mas vai além, abrangendo a aferição da compatibilidade de seu conteúdo com os princípios constitucionais, como proporcionalidade e razoabilidade.

Com efeito, consideram-se tais pré-compreensões para o julgamento do presente feito.

A Situação Concreta dos Autos

O demandante sofreu pena de demissão após processo administrativo disciplinar, em 14 de dezembro de 2017. Em mandado de segurança (nº 70076496637) foi concedida a segurança para determinar a reintegração do servidor, verbis:

MANDADO DE SEGURANÇA. ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO. DEMISSÃO. INCONTINÊNCIA PÚBLICA. NÃO CARACTERIZADA. PRÁTICAS PARA AS QUAIS NADA CONTRIBUIU A CONDIÇÃO DE SERVIDOR PÚBLICO. ANULAÇÃO DO ATO ADMINISTRATIVO QUE EMERGE JÁ DE PONDERAÇÕES A RESPEITO DO QUE POSTO NO PRÓPRIO PARECER EM QUE ELE SE VIU FUNDAR. POSSIBILIDADE. O ato administrativo demissório, oriundo de Processo Administrativo Disciplinar, deve revestir-se, além da legalidade formal, de legalidade material. Caso em que a demissão do impetrante, embora garantida a ampla defesa e o contraditório prévios, revelou-se ilegal, na medida em que, perpetrados os atos que a deflagraram em ambiente privado, que teriam também natureza penal, não se abria espaço para reconhecimento de conduta classificável como de “incontinência pública”. Fatos objeto de autuação em flagrante que somente vieram à tona quando da ação policial respectiva, e para cuja prática de nada serviu a condição do impetrante de servidor público. Interpretação forçada dos acontecimentos, aferível já do que constou do próprio parecer que recomendou a demissão, que não se afeiçoa à legalidade e nem resiste ao contraste com os princípios da proporcionalidade e razoabillidade. Análise que não demanda mais aprofundada incursão no exame da prova, assim viabilizada na sede estreita do “writ”, e que, porque não diz especificamente com critérios de conveniência e oportunidade, bem pode ser realizada pela jurisdição sem a pecha de investida em espaço que não lhe seria próprio, coberto pela independência entre os poderes. SEGURANÇA CONCEDIDA, POR MAIORIA. (Mandado de Segurança, Nº 70076496637, Tribunal Pleno, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Marcelo Bandeira Pereira, Julgado em: 11-06-2018).

Nesta ação, postula o autor o pagamento de seus vencimentos a partir de sua exclusão indevida (14/12/2017) até a sua reintegração (em 17/09/2019).

Diante da nulidade do ato de demissão do servidor, mostra-se possível a indenização por danos materiais, correspondentes à sua remuneração e aos reflexos devidos no período em que ficou o servidor indevidamente afastado do serviço público, desde a data de seu afastamento até sua efetiva reintegração ao cargo.

A propósito, assim já decidi:

APELAÇÃO CÍVEL. SERVIDOR PÚBLICO. SUPERVENIENTE EXTINÇÃO DO PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR. AUSÊNCIA DE INTERESSE PROCESSUAL. PERDA DO OBJETO. PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO INDENIZATÓRIA. INDENIZAÇÃO POR DANOS EXTRAPATRIMONIAIS. NÃO CABIMENTO. PAGAMENTO DE VENCIMENTOS A PARTIR DO ATO DE DEMISSÃO ATÉ A REINTEGRAÇÃO. POSSIBILIDADE. 1. Diante da reintegração do autor ao cargo de Fiscal; bem como diante da abertura de novo processo administrativo disciplinar, a presente ação perdeu parcialmente seu objeto em virtude de fato superveniente. 2. Conforme entendimento pacífico do Eg. Superior Tribunal de Justiça, o prazo prescricional, no que tange à pretensão indenizatória em face da Fazenda Pública, é quinquenal (REsp 1251993/PR). 3. Ausente qualquer prova de ato ilícito ou omissão administrativa por parte da Administração Pública, não se configuram os requisitos jurídicos da responsabilidade civil extracontratual do Estado. Afastado o pleito de condenação do Município ao pagamento de indenização por danos extrapatrimoniais. 4. Diante da nulidade do ato de demissão do servidor, mostra-se possível a indenização por danos materiais, correspondentes à sua remuneração e aos reflexos devidos no período em que ficou o servidor indevidamente afastado do serviço público, desde a data de seu afastamento até sua efetiva reintegração ao cargo. 5. A reintegração do autor ao cargo de fiscal foi determinada neste feito tão somente em relação à pena de demissão aplicada em virtude do PAD 1171/2012. Se em outro PAD (nº 2624/2016) foi novamente aplicada a pena de demissão ao servidor, esta não é afetada pela presente decisão. PRELIMINAR ACOLHIDA. APELO DO MUNICÍPIO PARCIALMENTE PROVIDO (ART. 932, INC. V, DO CPC E ARTIGO 206, XXXIX, DO REGIMENTO INTERNO DESTE TRIBUNAL). APELAÇÃO DO AUTOR CONHECIDA EM PARTE E PARCIALMENTE PROVIDA (ART. 932, INC. V, DO CPC E ARTIGO 206, XXXIX, DO REGIMENTO INTERNO DESTE TRIBUNAL). (Apelação Cível, Nº 70083104281, Terceira Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Leonel Pires Ohlweiler, Julgado em: 08-04-2020)

APELAÇÃO CÍVEL. SERVIDOR PÚBLICO. MUNICÍPIO DE GRAVATAÍ. NOMEAÇÃO. AUDITORIA DO TCE. RECLASSIFICAÇÃO. DESCONSTITUIÇÃO DO ATO. IRREGULARIDADES SANADAS. EXONERAÇÃO ILEGAL RECONHECIDA POR DECISÃO JUDICIAL. REINTEGRAÇÃO AO CARGO. INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS. CABIMENTO. 1.  O demandante foi nomeado para o cargo de Fiscal Tributário do Município de Gravataí, em 18/06/1997, por meio da Portaria nº 648/97, pois aprovado em 8º lugar no concurso público. 2. Após a instauração de auditoria do Tribunal de Contas para avaliação de pontos na prova de títulos pelo tempo de serviço público, foi gerada uma nova lista de candidatos classificação. 3. O autor impetrou mandado de segurança nº 015/104.0007173.2, buscando sua manutenção no cargo, bem como que fosse reconhecido a validade da sua admissão, mas foi denegada a ordem. 4. Inconformada, a parte autora ajuizou ação rescisória nº 70053131405, que reconheceu a existência de erro no acórdão rescindendo, constatando a irregularidade do ato de exoneração levado a efeito, bem como determinando a reintegração ao cargo público que ocupava. 5. Diante da nulidade do ato de exoneração do servidor, mostra-se possível a indenização por danos materiais, correspondentes à sua remuneração, às vantagens e aos reflexos devidos no período em que ficou o servidor indevidamente afastado do serviço público, desde a data de seu afastamento até sua efetiva reintegração ao cargo. Como consequência lógica da reintegração do servidor no cargo, devem ser assegurados todos os direitos que lhe foram suprimidos em razão da ilegal exoneração, inclusive o pagamento dos vencimentos e a contagem do tempo de serviço. 6. (…). APELAÇÃO PROVIDA. AÇÃO JULGADA PROCEDENTE. (Apelação Cível Nº 70078630753, Terceira Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Leonel Pires Ohlweiler, Julgado em 25/10/2018) (grifei)

No tocante ao pedido de dedução do período de afastamento do servidor (64 dias) em face de prisão preventiva, igualmente não procede.

O Eg. Supremo Tribunal Federal, por ocasião do julgamento do RE 482.006/MG, consagrou o entendimento de que a “redução de vencimentos de servidores públicos processados criminalmente colide com o disposto nos arts. 5º, LVII, e 37, XV, da Constituição, que abrigam, respectivamente, os princípios da presunção de inocência e da irredutibilidade de vencimentos” (RE 482006, Relator(a):  Min. RICARDO LEWANDOWSKI, Tribunal Pleno, julgado em 07/11/2007, DJe-162 DIVULG 13-12-2007 PUBLIC 14-12-2007 DJ 14-12-2007 PP-00050 EMENT VOL-02303-03 PP-00473 RTJ VOL-00204-01 PP-00402).

No mesmo rumo, os seguintes julgados do STF:

AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO EXTRAORDINÁRIO. CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. POLICIAL CIVIL. PRISÃO PREVENTIVA. SUSPENSÃO DE VENCIMENTOS. VIOLAÇÃO AOS PRINCÍPIOS DA PRESUNÇÃO DE INOCÊNCIA E DA IRREDUTIBILIDADE DE VENCIMENTOS. DESPROVIMENTO. 1. A decisão proferida pelo Tribunal de origem contraria a jurisprudência desta Corte, uma vez que a suspensão de vencimentos em virtude das faltas ao serviço decorrentes de prisão preventiva atenta contra os princípios da presunção de inocência e da irredutibilidade dos vencimentos do servidor público. Precedentes. 2. Agravo regimental a que se nega provimento. (RE 1104426 AgR, Relator(a):  Min. EDSON FACHIN, Segunda Turma, julgado em 29/04/2019, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-093 DIVULG 06-05-2019 PUBLIC 07-05-2019)

DIREITO ADMINISTRATIVO E DIREITO PROCESSUAL CIVIL. SERVIDOR PÚBLICO ESTADUAL. PRISÃO PREVENTIVA. SUSPENSÃO DO PAGAMENTO DOS VENCIMENTOS PELA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. OFENSA AOS PRINCÍPIOS DA IRREDUTIBILIDADE DE VENCIMENTOS E DA PRESUNÇÃO DE INOCÊNCIA. PRECEDENTES. CONSONÂNCIA DA DECISÃO AGRAVADA COM A JURISPRUDÊNCIA CRISTALIZADA DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. RECURSO EXTRAORDINÁRIO E AGRAVO MANEJADOS SOB A VIGÊNCIA DO CPC/2015. 1. O entendimento assinalado na decisão agravada não diverge da jurisprudência firmada no Supremo Tribunal Federal, no sentido da impossibilidade de redução dos vencimentos de servidor público preso preventivamente. Precedentes. 2. As razões do agravo interno não se mostram aptas a infirmar os fundamentos que lastrearam a decisão agravada. 3. Em se tratando de mandado de segurança, inaplicável o artigo 85, § 11, do CPC/2015. 4. Agravo interno conhecido e não provido, com aplicação da penalidade prevista no art. 1.021, § 4º, do CPC/2015, calculada à razão de 1% (um por cento) sobre o valor atualizado da causa, se unânime a votação. (ARE 1059669 AgR, Relator(a):  Min. ROSA WEBER, Primeira Turma, julgado em 22/03/2019, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-066 DIVULG 02-04-2019 PUBLIC 03-04-2019)

AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO. ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO ESTADUAL. PRISÃO PREVENTIVA. DESCONTOS EFETUADOS NOS VENCIMENTOS DURANTE O PERÍODO DE RECLUSÃO. AFRONTA AOS PRINCÍPIOS DA PRESUNÇÃO DE INOCÊNCIA E DA IRREDUTIBILIDADE DE VENCIMENTOS. ACÓRDÃO RECORRIDO EM HARMONIA COM A JURISPRUDÊNCIA DO SUPREMO. NATUREZA JURÍDICA DAS VERBAS. INCURSIONAMENTO NO CONJUNTO FÁTICO-PROBATÓRIO. IMPOSSIBILIDADE. INCIDÊNCIA DA SÚMULA 279 DO STF. REITERADA REJEIÇÃO DOS ARGUMENTOS EXPENDIDOS PELA PARTE NAS SEDES RECURSAIS ANTERIORES. MANIFESTO INTUITO PROTELATÓRIO. MULTA DO ARTIGO 557, § 2º, DO CPC/1973. APLICABILIDADE. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO. (ARE 893425 AgR, Relator (a):  Min. LUIZ FUX, Primeira Turma, julgado em 31/03/2017, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-087 DIVULG 26-04-2017 PUBLIC 27-04-2017)

Nesse sentido, converge a jurisprudência da Corte local, como se colhe dos precedentes resumidos nas ementas abaixo transcritas:

APELAÇÕES CÍVEIS. SERVIDOR PÚBLICO MUNICIPAL. PRISÃO PREVENTIVA DECRETADA EM PROCESSO CRIMINAL. SUSPENSÃO DO PAGAMENTO DE VENCIMENTO. ILEGALIDADE. JURISPRUDÊCIA DESTA CORTE E DO PRETÓRIO EXCELSO. DANO MORAL NÃO CONFIGURADO. 1. De acordo com entendimento reiterado do E. STF e desta Corte, é ilegal a suspensão ou a redução de vencimentos de servidor público afastado por motivo de prisão cautelar decretada em processo penal, visto que contraria os princípios da irredutibilidade dos vencimentos e o da presunção de inocência. 2. O fundamento axiológico de tal compreensão é o de que a prisão cautelar, decretada em razão de circunstâncias e motivos de cunho processual, não afasta a presunção de inocência assegurada constitucionalmente (art. 5º, inc. LVII, da Carta Constitucional), com o que o obstáculo ao comparecimento ao trabalho pelo servidor assim recolhido provisoriamente não pode privá-lo de seus direitos, especialmente aqueles que dizem com a subsistência dele e de seus familiares, a compor o seu mínimo existencial e de que somente poderá ser privado uma vez afirmada sua culpa em sentença judicial definitiva. 3. Danos morais indenizáveis não caracterizados na hipótese vertente. 4. Ação julgada parcialmente procedente na origem. APELAÇÃO DO MUNICÍPIO DESPROVIDA. APELAÇÃO DO AUTOR PARCIALMENTE PROVIDA. UNÂNIME. (Apelação Cível, Nº 70081760332, Quarta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Eduardo Uhlein, Julgado em: 27-11-2019).

APELAÇÃO CÍVEL. SERVIDOR PÚBLICO. AGENTE PENITENCIÁRIO PROCESSADO CRIMINALMENTE. PRISÃO PREVENTIVA. DESCONTO DE UM TERÇO EM SUA REMUNERAÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA E PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS. PRELIMINARES. 1. O recurso merece ser conhecido apenas em parte, acolhendo-se a preliminar de inovação recursal, pois o apelante deduziu pretensão que não integra a petição inicial, qual seja, de que houve a violação ao princípio do contraditório e da ampla defesa. 2. A partir da leitura das razões recursais, é crível admitir que a parte apelante atacou os fundamentos da sentença. 3. Não colhe êxito a preliminar de inépcia recursal, porquanto preenchidos os requisitos do artigo 1.010 do CPC/15. 4. A constitucionalização da Administração Pública determina a aplicação dos artigos 1º, 3º e 37, “caput”, da Constituição Federal, ao âmbito do exercício de toda competência administrativa. 5. Os princípios e os direitos fundamentais são relevantes no controle substancial das atividades da Administração Pública, submetida à legalidade e à unidade de sentido dos demais princípios. O controle de juridicidade administrativa qualificada exige submeter os atos administrativos ao Direito, conforme precedentes do STF e do STJ. 6. O autor/apelante, Agente Penitenciário, sofreu ação penal, vindo a ser condenado como incurso nas sanções do art. 288 c/c art. 316, caput, c/c art. 29, caput, c/c art. 69, caput, todos do Código Penal, sendo decretada a sua prisão preventiva em 27.04.2016, bem como foi afastado do exercício de suas funções. A partir de maio/2016, passou a sofrer descontos em seus vencimentos no valor correspondente a 1/3 (um terço). 7. O Eg. Supremo Tribunal Federal, por ocasião do julgamento do RE 482.006/MG, consagrou o entendimento de que a “redução de vencimentos de servidores públicos processados criminalmente colide com o disposto nos arts. 5º, LVII, e 37, XV, da Constituição, que abrigam, respectivamente, os princípios da presunção de inocência e da irredutibilidade de vencimentos”. 8. Decisão do Plenário do STF desobrigando seja suscitado incidente de inconstitucionalidade, nos termos do §único do artigo 949 do CPC. 9. Diante da ofensa ao princípio da presunção de inocência (art. 5º, LVII, CF), porquanto ausente trânsito em julgado da ação criminal condenatória, deve ser julgada procedente a ação para determinar a cessação do desconto de um terço dos vencimentos do servidor, enquanto não confirmada e transitada em julgado a condenação penal. 10. Possível, ainda, a restituição dos valores descontados indevidamente dos vencimentos do servidor. 11. No período anterior à vigência da Lei nº 11.960/09 deve ser o IGP-M como índice da correção monetária, e juros de mora de 6% ao ano a partir da citação. Posteriormente, tem aplicação a aludida legislação até a data de 25/03/2015, momento em que o Supremo Tribunal Federal modulou os efeitos do julgamento da ADI nº 4357-DF, cujos créditos a partir desta data deverão ser corrigidos pelo Índice de Preços ao Consumidor Amplo Especial (IPCA-E). ACOLHIDA A PRELIMINAR DE INOVAÇÃO RECURSAL. REJEITADA A PRELIMINAR DE INÉPCIA RECURSAL. APELAÇÃO CONHECIDA EM PARTE, E NESTA, PARCIALMENTE PROVIDA. AÇÃO JULGADA PARCIALMENTE PROCEDENTE. (Apelação Cível, Nº 70076047117, Terceira Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Leonel Pires Ohlweiler, Julgado em: 28-06-2018)

Logo, não merece provimento o recurso.

IV – DISPOSITIVO

Ante o exposto, com base no art. 932, inc. IV, do CPC e no artigo 206, XXXVI, do Regimento Interno deste Tribunal, NEGO PROVIMENTO à apelação.

Os honorários recursais deverão ser fixados por ocasião da liquidação do julgado, conforme determinado em sentença.

Intimem-se.

Diligências legais.

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