* DAVI DAMIAN
Disse Haruki Murakami: “[…] no fundo todos aguardam o fim do mundo […]”. A destruição do outro sempre foi cotidiana, mesmo simbólica ao dizer “meu time é melhor que o seu; tirei a maior nota da turma”, agora midiática em tempo real, o desejo e ato de desdém em relação a algo e alguém, vendo outrem em situação desesperadora, transmite a sensação de bem estar para alguns, já que olham, mas não estão em tal condição e nem desejam tal aflição.
Fazer uma refeição vendo alguém caçando/lutando para comer, ou uma guerra a mais para entretenimento. A violência como passatempo da vida real, alguns sofrem realmente ao observarem o que ocorre, mas não podemos sofrer por/com tudo, mas algo sempre nos afeta. A pior violência é a inação e a anestesia de ver e estar de mãos atadas, gritar embaixo d’água, como em Allan Poe, a sensação ser enterrado vivo socialmente e diariamente alguém joga uma pá de terra, como Ciderela e sua labuta diária e sonhar que será salva de tal sofrimento, ainda mais na própria “família”
A explosão de filmes de terror como a trilogia “Terrifier” (um palhaço macabro), um filme “slasher”, a morte por morte que muitos pagam ver, só as notícias fúnebres não bastam mais hoje em dia, a escopofilia sempre aflora, o “quero ver como foi”, “que horror, mas antes ele do que eu”. Como personagens carinhosos da infância agora entraram em Domínio Público (sem dono basicamente),Popeye, Urso Pooh, Mickey e Cinderela são um exemplo, esta ultima possui um filme recente baseado em sua história chamado “The ugly stepsister” ou “A meia irmã Feia”, na ótica não de Cinderela, mas de sua meia irmã, em que esta faz procedimentos horrendos para ser encantadora para o baile do príncipe, passando por um mar de calamidades e Cinderela fica sem ação posto que a mãea quis assim.
Essa nova versão de Cinderela mesclando crítica social e estética corporal além dos pesados momentos de suor e sangue, escancara que não vemos pessoas, vemos números, likes, contagem de corpos em perfis de seguidores, assistimos personagens exercendo um papel no cotidiano e também somos um deles, tudo pela aceitação e 15 minutos de fama como disse Andy Warhol.
Títeres sem perceber o titereiro e tais filmes chocantes, talvez, façam com que venhamos a perceber quais cordas nos controlam, ou deixam as amarras ainda mais fortes, cada um prendendo a si em um teatro rotineiro de uma subvida.
*Psicólogo, Mestre e Doutor em Psicanálise pela UFRGS.