O radicalismo e o fundamentalismo tropical que emergem

Essa eleição representou, pior de tudo, a morte da razão.

Fiquei observando na  noite passada e no dia de hoje os analistas políticos comentando e externando opiniões sobre o debate de ontem na Globo.

Dentro dos canais de esquerda que escuto, DCM, 247 …, assim como os de direita, as posições são unânimes e acríticas. Só Lula presta ou só Bolsonaro presta. Perderam completamente o bom senso, a análise crítica desapaixonada e ninguém mais tem compromisso com a uma análise real, capaz de levantar os erros e os acertos de ambos, afinal, até a Nina, com 12 anos, é capaz de perceber que tanto Lula quanto Bolsonara tiveram momentos bons e momentos ruins.

É claro, a morte da razão trás embutida em si mesma, a cegueira, a pior cegueira, que é a cegueira maniqueísta ideológica. O que eu mais discuto são pessoas com larga formação acadêmica, especialmente em ciência política ou sociologia e filosofia políticas, agindo e reagindo como garotos de 19, 20 anos. Coisa de estudantes.

Patético é que essa contaminação da cegueira ideológica alastrou-se de norte a sul do país. O saldo triste  é o empobrecimento generalizado do debate. Pequena exceção, até porque o site se diz de direita, é o Antagonista, especialmente Cláudio Dantas, mas pequena.

Na faculdade de Sociologia, especialmente nós que lidamos com Pesquisas Eleitorais, sempre foi muito aceso o debate sobre a neutralidade científica, embora eu sempre discordei um pouco das teses dominantes.

Procuro entender o pensamento do agronegócio brasileiro a partir do pensamento de setor, mas também está tudo fortemente ideologizado. É o PT fazendo apologia da agricultura orgânica e da pequena propriedade familiar, e a ala bolsonarista generalizando a crítica e a defesa, a ponto de um candidato a presidente, como Lula, chamar o agro brasileiro de fascista.

Se os adultos perdem as referências morais e se tornam incapazes de fazer uma análise sincera de ambos os lados, o que esperar da geração de minha filha, com 12 anos?

Não sem razão no Colégio dela os cabelos são pintados de verdes e de vermelhos, até nisso o maniqueísmo tomou vulto.

Pela leitura histórica, sem exageros, estamos mergulhados, aqui no Sul, nos velhos conflitos entre Ximangos e Maragatos.

Não quero com isso dizer que não existam pessoas centradas, que estão na política sem paixões radicalizadas. É claro que existem. É como tomar um lado na invasão da Ucrânia, os argumentos atlanticistas e anti-atlanticistas são permeados de radicalismos e paixões ideológicas, a ponto de haver uma estranha convergência entre a direita francesa de Marine Le Pen apoiando Putin e a esquerda do PT e do PSOL e – é claro – até de Bolsonaro – todos putinistas.

Esse é um debate muito mal feito no Brasil e nossos analistas de geopolítica internacional são despudoramente fracos. Quase ninguém sabe entender a emergência de Giórgia Meloni, primeira-ministra italiana, que todos julgavam alinhada com a concepção de estado-nacional e, surpreendentemente, ocupou posição vivamente atlanticista ao lado da OTAN.  Falta leitura para compreensão dos vieses ideológicos da Europa e até ausência de compreensão do que pauta os movimentos mais populares da França e da Alemanha, onde muitos agora defendem as velhas teses de Ângela Merkel, ex-chanceler alemã, que que tinha excelentes relações com PUTIN e dois potentes gasodutos russos abastecendo a Alemanha. E isso que lá ainda é outono, esperem o inverno.

É claro, nas relações internacionais, o pragmatismo muitas vezes encontra eco. Recept Edorgan, presidente da Turquia, é um notável exemplo de pragmatismo.  Mas é uma uma notável exceção.

O problema é que esse radicalismo, identificado hoje na política partidária, se espraia para a Justiça, para a imprensa, para a economia, para o ensino médio e superior, e o que é pior, para as relações interpessoais. Hoje está insuportável namorar uma mulher bolsonarista ou petista, exceto se o cara for um  idiota perfeito. As mulheres evangélicas, mais pacíficas e mansas, hoje ficam dando discursos contra a ideologia de gênero e homossexuais. Vivemos um exemplo de uma mãe que correu um filho de casa por ser este homossexual. Quer coisa mais triste? O fundamentalismo há muito tempo coabita em nosso meio, só poucos conseguem enxergar esse cancro.

Não sei se voltaremos a normalidade de aceitar a coabitação das divergências e aceitação dos contrários.

O radicalismo nunca fui um caminho construtivo. Para nada.

E se o Israel de hoje fosse o Israel da Bíblia?

Professor Doutor Osvaldo Luiz Ribeiro

Coordenador do Programa de Mestrado Profissional em Ciências das Religiões da Faculdade Unida de Vitória (desde 2014). Professor do Programa de Mestrado Profissional em Ciências das Religiões da Faculdade Unida de Vitória (desde 2011). Pós-doutorado em Ciência da Religião pela Universidade Federal de Juiz de Fora (2016). Doutorado em Teologia (Bíblia Hebraica) pela PUC-Rio (2008). Bacharelado em Teologia pela Faculdade Teológica Batista do Paraná (2008). Mestrado (livre) em Teologia pelo Seminário Teológico Batista do Rio de Janeiro (2003). Bacharelado em Teologia (livre) pelo Seminário Teológico Batista do Sul do Brasil (1992). Pesquisa a Bíblia Hebraica a partir de metodologias histórico-críticas (exegese) e indiciárias Carlo Ginzburg), com desdobramentos histórico-sociais, preocupando-se com o mundo por trás dos textos, seu ambiente de redação, transmissão e recepção. Utiliza procedimentos hermenêuticos que se podem remontar a Schleiermacher e sua abordagem em face da intentio auctoris. Interessa-se ainda pela pesquisa crítica do fenômeno religioso de modo geral, e pela Fenomenologia da Religião (Eliade) em particular. Concentra-se na investigação do tema do Ensino Religioso público. Atua na interface entre religião e campos profissionais de modo geral. Palavras-chave: Bíblia Hebraica, religião, política, Ensino Religioso

Informações coletadas do Lattes em 10/10/2022