Eu achava que todo pastor era igual. Quando era criança, eu pensava que ser pastor era como ser médico ou professor, que existia um sindicato e uma lei que dizia como cada um deveria se comportar. Na minha cabeça, todo pastor acordava às 6h da manhã, tomava café preto e ia para o escritório orar. Que eles iam nos correios buscar as correspondências e visitar uma irmã muito idosa que oferecia doce em uma cremerinha verde.
Achava que depois do almoço, todo pastor dormia e que se ligassem pra eles, eles atenderiam meio aborrecidos, mas tratariam bem. Achava que todo pastor usava roupa social na rua e chinelo com meia em casa. Achava que todo pastor deixava de viajar com a família quando alguém importante adoecia, ou que abandonava as férias pra fazer velório. Achava que todo pastor acordava de madrugada pra orar pela irmã atribulada que não conseguia dormir e ligava desesperada por não aguentar mais uma noite de insônia. Achava que todo pastor comia rápido, trazia ovos e bolos pra suas famílias todos os dias e depois repartia com todo irmão que chegaasem na hora do café das 17h. Achava que todo pastor esquecia de tudo e que suas esposas precisavam os lembrar todos os dias dos horários dos compromissos (que não fossem da igreja, esses todos os pastores lembravam).
Eu achava que todo pastor, na segunda feira, no dia da tal folga do pastor, trabalhava também. Na verdade, achava que todos os pastores também não tinham folga. Eu achava que todos os pastores do mundo tinham uma maleta de estudos onde também eram escondidas balinhas para as crianças que eles visitavam.
Eu achava muitas coisas sobre todos os pastores. Eu achava que todos os pastores choravam escondidos e que quando estavam cansados, exaustos, eles pediam a Deus força pra suportar o peso de uma congregação. Achava que todos os pastores sabiam ignorar fofocas, intrigas e picuinhas dos irmãos.
Achava também que tinham um super poder de não perceber cantadas de irmãs sem noção (acontecia!). Achava que todo pastor era igual. Achava que todo pastor buscava ovelha desgarrada no presídio, em casa ou até em outra cidade.
Que todos levavam ceia no hospital ou na casa do irmão doente (sem ter que pedir). Achava que todo pastor não sentia cheiro ou nojo, que todo pastor amava alcoólatra e os ajudava, que amava gente quebrada, mesmo, de verdade. Achava que todo pastor colocava a igreja acima até de sua família as vezes.
Só depois que sai de Santiago, que conheci outras congregações é que descobri que os pastores não são iguais. Tem uns que nem visitam. Uns que não mandam bom dia, boa tarde e boa noite no whatsapp. Tem uns que não vão no hospital e outros que tem pavor de chimarrão. Descobri que tem pastor que se você ficar dois meses sem ir na igreja, não te perguntam como você está. Descobri que tem pastor que não te dá meus pêsames quando você perde uma pessoa amada. Descobri que tem pastor que só trabalha com irmão rico, que tem iate, que dizima bem. Descobri que tem pastor ladrão, que tem pastor que não é pastor, que é lobo disfarçado.
Descobri que nem todo pastor sabe perdoar quando um irmão sai da igreja e retorna. Descobri que nem todo pastor sabe orar pelos outros irmãos, mesmo quando está com uma doença crônica, sentindo dor e medo. Descobri que nem todo pastor agradece a Deus pela família que tem. Descobri que tem pastor que não sabe levar uma palavra de conforto e que não sabe quando é hora de não fazer piada. Descobri que pastor erra e também, que as vezes, a gente acha que ele está errado e ele está certo.
Descobri muitas coisas quando cresci. Descobri que meu pai era pai e também pastor. Que as vezes é difícil separar uma coisa da outra e que as vezes, só as vezes, a gente queria muito que fosse só um ou só outro. Que ele não tinha super poder e que era humano, muito humano. Que ele sentia dor, enjôo, cansaço, exaustão, medo e raiva. Descobri que ele sentia culpa quando não sabia o que fazer. Que ele era como todos nós.