*Júlio Prates
Entender a recente vitória verde no último domingo, na França, bem como entender a forte presença Verde na Alemanha, Suécia, Áustria … implica em entender a genealogia dessas ideias, que há décadas permeiam a política europeia e que – agora – em meio a pandemia mundial do coronavírus, parecem ter seu apogeu.
FRANÇA, JUNHO DE 2020, PANDEMIA MUNDIAL DO CORONAVÍRUS
Eu já escrevi, domingo, dia 28, sobre a derrota que o presidente da França, Emmanuel Macron, sofreu nas eleições municipais francesas. Quem também naufragou junto foi o primeiro-ministro Édouard Philippe, já bombardeado pela sua política indecisa e fraca em face do coronavírus, assim como os conservadores republicanos e os direitistas históricos de Le Pen, que amargam sua maior derrota.
Surge uma tendência política clara no mundo da pandemia do coronavírus.
O interessante nesse contexto foi à abstenção de 59% do eleitorado. Casualmente, sábado recente, conversando com o amigo Guilherme Bonotto, frisei que a eleição municipal de outubro ou novembro próximo seria marcada por alto índice de abstenção. Pois esse cenário se evidenciou na eleição francesa.
Contudo, essa eleição na França trouxe vários elementos de ciência política novos ao debate. Primeiro, é a forte ascensão dos Verdes, com uma plataforma ambientalista e assentada nos direitos civis. Segundo, foi à reeleição da socialista (natural da Espanha) Anne Hidalgo, coligada com os verdes, e que só anda de bicicleta, que derrotou a conservadora republicana Rachida Dati, ex-ministra da Justiça do País. Em ambos os contextos, sempre a forte presença dos manifestantes coletes amarelos (para mim é verde limão).
Já nas grandes cidades francesas, como Marselha, Lyon, Bordeaux, Poitiers, Annecy e Besancón (terra de Proudhon), a vitória foi dos Verdes, ratificando uma forte tendência já identificada na eleição do parlamento europeu em 2019.
Interessante destacar que o Partido Verde, todos os PVs europeus, tem origem na esquerda, inclusive, na França, com grandes líderes remanescentes de maio de 1968.
Essa guinada à esquerda, experimentada pelo país tido como um dos mais cultos do mundo, já é claramente consolidada na Alemanha, onde os Verdes já representam a segunda força política do país. Ademais, é do pleno conhecimento de quem estudou maio de 1968, na França, que um dos grandes líderes do movimento era o judeu-alemão Daniel Cohn-Dendit, anarquista de esquerda.
É importante, nesse momento uma revisitação histórica sobre o movimento estudantil francês de maio de 1968.
Os Verdes – hoje – têm a ecologia no epicentro de sua proposta política, defendem uma agricultura sustentável e sem agrotóxicos, defesa da agricultura familiar e de subsistência, centrada na pequena propriedade, aproveitamento racional dos recursos naturais renováveis, reciclagens, cuidados extremos com rios e nascentes, não poluição do ar, da terra e dos oceanos e são ligadíssimos nos Princípios do Greenpeace. Destaque para a proposta anti-nuclear, bandeira mundial em comum aos verdes.
É bom entendermos que os verdes, embora com uma variância de origem na esquerda, sempre estabeleceram grandes debates contra os marxistas ortodoxos, socialistas, sociais-democratas e comunistas, justamente pela variância anarquista do pensamento ecologista.
Por incrível que pareça aí surge uma revisitação histórica aos pressupostos teóricos de Pierre-Joseph Proudhon (FOTO). Aliás, Proudhon nasceu em Besançon, grande cidade francesa onde os verdes conquistaram o domínio municipal domingo último.
Sugiro os meus leitores que assistam ao filme “O Jovem Marx”, disponível no Youtube. Esse filme mostra a profunda admiração que Karl Marx tinha por Proudhon, que é, digamos assim, uma espécie de tataravô do movimento anarquista francês.
Os verdes atuais tem um viés pragmático no que tange as relações exteriores, sendo nacionalistas nas questões ecológicas locais, mas fortemente ligadas às questões internacionais ambientais que une os vários partidos verdes europeus. Bandeiras como combate ao efeito estufa, salve o ozônio, o ozônio salva, combate ao desmatamento, harmonia na agricultura, aversão aos agrotóxicos, combate as poluições urbanas, inclusive com uma crítica tenaz ao atual desenvolvimento industrial, passando por uma forte crítica à indústria automobilística, defesa da energia solar, eólica e hidráulica, repúdio ao petróleo e seus derivados, combate as guerras e a indústria armamentista, combate ao serviço militar obrigatório, defesa radical do saneamento, e – é claro – do acordo de Paris sobre o clima … são algumas das bandeiras verdes. Ademais, vale frisar a aversão verde as grandes lavouras monoculturais (detestam soja) e combatem ferozmente os agrotóxicos.
USO MACIÇO DA BICICLETA
Avessos a carros e motos, os verdes, na França e demais países expressivos da Europa, são famosos pelo uso da bicicleta.
Entretanto, os verdes atuam fortemente em cima dos direitos civis, como o combate ao racismo e qualquer tipo de preconceito e defendem abertamente a liberação da maconha e algumas drogas leves. É claro, os verdes defendem a redução do Estado na economia, mas não pelo viés neoliberal e – sim – anarquista.
OS VERDES NO BRASIL
No Brasil, o PV foi articulado enquanto ideologia política por Fernando Gabeira, Alfredo Sirkis, Carlos Minc, dentre outros, mas com um viés no MR8, de origem marxista, nos idos dos anos 80, mas legalizado enquanto Partido Político em 1986.Eu anotei muito e observei o nascimento e desenvolvimento do PV em nosso país, e denota-se uma vertente muito mais ligada à liberação das drogas, aborto e direitos civis, do que uma proposta econômica propriamente dita, que foi apropriada pelo PT.
CHICO MENDES E MARINA SILVA, NO ACRE
O PV teve seu auge com Chico Mendes, no Acre, de onde também emergiu Marina Silva, que foi do PV e depois rompeu com os verdes, passou pelo PT e criou o REDE DE SUSTENTABILIDADE. Entretanto, por ser conservadora e evangélica, Marina nunca fechou com os verdes mais genuínos, também defensores do aborto, da liberdade do corpo (leia-se homossexualismo e todas as formas de amar). As propostas verdes acabaram sendo engolidas pelos PT e PSOL. Hoje, o PV têm uma bancada de 4 deputados federais no congresso nacional e o REDE tem 1. O atual líder do PV no Congresso é o jovem advogado paulista Enrico Val Blarcum Graaff.
O PV no Brasil foi bastante esteriotipado, especialmente com as candidaturas a presidente do país do jornalista Fernando Gabeira, hoje GloboNews, que ficou famoso no mundo por liderar o sequestro do embaixador norte-americano Charles Elbrick, em 1969. Até hoje é proibido de entrar nos EUA e, se entrar, existe ordem de prisão contra si. Gabeira foi deputado federal e quase ganhou as eleições para governador do Rio de Janeiro. Atualmente, tem 79 anos. Escritor e jornalista de grande credibilidade. Autor de livros mundialmente reconhecidos, foi objeto de filmes, novelas e séries na rede Globo.
Muito criticado pela esquerda, virou ícone dos bolsonaristas na sucessão de 2018. Leia mais no DCM:
ENTENDER A VITÓRIA VERDE NA FRANÇA – 28/06/2020
Entender a recente vitória verde no último domingo, na França, bem como entender a forte presença Verde na Alemanha, Suécia, Austria … implica em entender a genealogia dessas ideias, que há décadas permeiam a política europeia e que – agora – em meio a pandemia mundial do coronavírus, parecem ter seu apogeu. Se olharmos a forte presença verde no parlamento europeu, é indicativo de uma tendência pesada.
É um espectro que assombra a Europa. O espectro do anarquismo ecológico.
*Jornalista, MTb-RS 11.175. Editor do Blog. Advogado e Bacharel em Sociologia.
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