Júlio Prates*
O ensino superior no Brasil desenvolveu-se, desde suas raízes históricas, sob o signo de instituição problema.
Além de não desempenhar as suas funções sociais que justificassem sua razão de ser, alcançou sempre rendimentos baixíssimos, a partir de um péssimo aproveitamento dos fatores humanos educacionais. A má escola perpetua-se pelo mau ensino.A escola superior, criada à luz de uma sociedade oligárquica, de estruturas rígidas, desempenhou, em seu limiar, funções societárias bem definidas, a transmissão dogmática dos conteúdos importados e a formação dos filhos das elites dominantes de então, ambas necessárias à manutenção do “status quo” dessas elites.
Sufocada pelo caráter elitista e pelo compromisso classista com as forças conservadoras, a escola superior não engendrou o que seria um processo dinâmico de desenvolvimento a partir da valorização do pensamento crítico, no incentivo à pesquisa e da criação científica e tecnológica. Consequentemente, não reproduziu os valores humanos e intelectuais necessários ao pleno amadurecimento como instituição, seu desenvolvimento foi atrofiado desde as origens.
A revolução de 30, aparentemente, destruiria o caráter árquico da sociedade imperial, abrindo novos horizontes dentro de uma sociedade télica, de sociedade emergente: a republicana. Uma sociedade voltada para o desenvolvimento , onde a nova função social possibilitaria, como instituição, livrar-se das características atrofiantes de suas raízes.Mas, dentro do extenso quadro social, as forças conservadoras galgaram novas posições, articularam a reorganização da sociedade nacional, segundo seus interesses, limitando a pequenos passos de uma elite o que deveria ser o início da caminhada de inteira de um povo.Dentro da instituição do ensino superior, a vitória das forças conservadoras deu-se sobre o prisma de universidade conglomerada .
A simples conglomeração de cursos superiores em universidades, sem um interrelacionamento dinâmico entre os cursos e um redirecionamento funcional, fez com que se mantivesse o caráter anacrônico do padrão de escola superior original, além de permitir um controle mais eficaz, a partir da centralização nas reitorias e nos conselhos universitários. Mais uma vez, o ensino superior não obteve fôlego para acompanhar os progressos sociais limitados de uma sociedade contraditória: télica, voltada para o futuro, o progresso , pela sua nova nova estruturação republicana é árquica – voltada para o passado, para suas raízes, pelas suas condições econômicas.
Apesar das aparências modernizantes da universidade conglomerada, a simples aglomeração de escolas superiores não vingou uma universidade multifuncional. Isto é, a multiplicidade de inter-relações entre as diversas escolas da universidade de forma funcional , dinâmica e participante do processo social em curso.
A universidade conglomerada não atingiu, portanto, os anseios da vanguarda intelectual tanto do corpo docente como discente. Assim, como uma nação inteira buscava sua emergência dentro do processo histórico.É nesse quadro estéril qualitativamente que se desencadeou a reprodução quantitativa dos estabelecimentos de ensino superior.
Nos meados da década de 60, as pressões da vanguarda universitária, aliada a evolução política da época, possibilitaram experiências novas, de uma universidade que exercesse realmente suas funções sociais a partir de uma visão progressista de esquerda, como foi o caso da UnB.
O resultado dessa experiência foi a formação de um padrão médio intelectual bem acima do padrão médio, além do desenvolvimento do pensamento crítico.Esse processo, é claro, não se deu apenas no âmbito do ensino superior, mas sim no amplo contexto social, provocando imediata reação das forças dominantes.Paradoxalmente, foi esta reação às forças de vanguarda que possibilitou a unificação e o direcionamento de seus movimentos políticos. Detectado o erro, a reação partiu para uma nova tática. Impossibilitada de reprimir pela força a fermentação política nas universidades brasileiras e pressionada tanto pelos EEUU como pelas elites empresariais nacionais, o governo militar aceitou a modernização do ensino superior consentido a reforma universitária.
Uma reforma encabeçada pelas forças conservadoras, voltadas para uma mobilização apenas formal da universidade, mantendo-a atrelada.A contradição estava inserida na própria idéia desenvolvimentista de uma sociedade com características télicas em sua ideologia de desenvolvimento e de estrutura tectônica (baseada na ordem) no plano institucional de governo.Desta contradição não poderia emergir, senão, uma universidade estéril em sua vida universitária, defasada da realidade social , anti-democrática e sem uma função social definida.Daí que decorre a visão atual, correta, aliás, dos governos Lula e Dilma de repensar a realidade universitária não só com uma visão reformista, mas reformular uma instituição histórica e estruturalmente insana.
Nesse contexto, o amplo surgimento de universidades com cursos afins à realidade socioenonômica da região, assim como os IFETs , é maior acerto de todo de um governo, o governo do PT, diga-se de passagem, bem como a tentativa de recompor erros históricos e corrigir essa insanidade que vem da revolução de 30, embora estejamos assistindo (quem lê o Estadão e a Folha de São Paulo) a pressão para acabarem com o ensino público e gratuito na USP.
De qualquer forma, concluindo essa breve reflexão aos leitores do blog, pelo menos existe uma tentativa modernizante de uma universidade com autonomia, democrática e um pouco mais voltada para a realidade social e econômica, embora alguns cursos adotem uma linha vivamente direitista, mas isso deve ser entendido e aceito no campo de pluralidade, pois não podemos sair de condição de oprimidos para opressores e nem criar uma escola de pensamento único de esquerda, daí ser salutar a multiplicidade de idéias e o inter-dinamismo entre cursos, com suas propostas e troca de versões e tendências.
(reedição, programação, blogger, feedback) * Editor do Blog. Advogado, sociólogo e jornalista.