Suseranagem e vassalagem, a triste reprodução de uma concepção discriminatória

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Ao produzir sua monumental obra “A Coluna Partida”, Frida Kahlo sintetizou um pouco de sua vida pessoal, dos seus dramas com o acidente que deixou seqüelas para o resto de seus dias, as cirurgias, o colete de aço e as dores. Na tela, Frida retratou um pouco de si mesma conduzida pela coluna grega partida, dos pregos às lágrimas, ela quis sintetizar a extensão dos seus sofrimentos.

Quem não tem um pouco de Frida em sua vida?

Todos nós somos marcados por sabores e dissabores, choros e risos, festas e tristezas. A rigor, não existe uma linha na vida que apenas conduza os fatos para um único lado, seja o lado bom, seja o lado dos acontecimentos que nos entristecem. Mesmo que nos esforcemos para assimilar a desgraça, a dor e as privações como segmento inerente ao cotidiano, às dificuldades de assimilação sempre nos assolam e quando chegam, provocam efeitos devastadores.

A principal válvula de escape institucional para o enfrentamento das desgraças da vida continua sendo a religião. Na religião, encontramos conforto e fuga para o enfrentamento das dores. A ilusão de que um ente querido vai para os céus após a morte é um consolo fantástico. Basta acreditar e a superação está com meio caminho andado. Difícil mesmo é trabalhar a vida e a morte, as dores e as desgraças, como parte inerente da vida, sem consolos, sem fugas, sem abstrações de cunho metafísico. Difícil mesmo é mimetizar as dores e angústias da vida e vivê-las de frente, tais como são, puras, cruas, sem subterfúgios, sem escapes, sem fugas.

As pessoas, de um modo em geral, tendem a julgar o ateu como desprovido de sentimentos. Nada mais errado. O ateu têm sentimentos como qualquer outra pessoa. Sofre, chora, sorri, lamenta-se. O mesmo raciocínio vale para o islâmico, xintoísta, budista …

A vida, para pessoas existencialistas como eu, é bem mais complicada, é marcada por um sentimento muito profundo de especulação sobre a dor, sobre a desgraça, sobre a morte…quando me defronto com a morte de alguém, caio numa profunda introspecção, penso, penso, analiso, não encontro respostas…já a pessoa que tem uma crença pré-definida, ela acredita na crença e pronto…tudo é mais simples, não tem especulações outras, não tem espaços para dúvidas e questionamentos. Para as pessoas que crêem, tudo é mais fácil, basta acreditar na crença.

Mas hoje, particularmente, nessa noite tristonha, de tempo nublado, de céus coberto por nuvens escuras, experimentei uma dessas raras sensações de tristezas.  Ao entrar em casa, sozinho, ao sentir o vazio, fui assaltado por uma estranha onda de incerteza, insegurança, quase um pânico. Não tenho gostado de certas arrogâncias, estão me fazendo mal. O que era já não é mais como era.

E agora, no vazio, na solidão, os reflexos da preocupação afloram em meio aos sintomas depressivos de um dia nublado e tristonho.

Foi, então, que lembrei-me de Frida Kahlo que externou seus sentimentos na arte, na confecção de um quadro, e na tela, traduziu jogos de sentimentos e mesclou dissabores com os sabores da arte.

Um dos melhores livro que li em minha vida foi “A NECESSIDADE DA ARTE”, de Ernest Fischer, e foi justamente, a partir dessa concepção estética, que tentei dar forma a uma outra manifestação de expressão: a escrita.

Ao invés da pintura de Frida, sem ser poeta, expresso também minhas angústias, dores, sentimentos e incertezas na tela virtual, numa socialização interativa, mas não menos expressiva.

Os ritos protocolares, onde uns são tratados de forma diferente dos outros, são abomináveis…por mais que eu escreva, jamais vão entender onde eu quero chegar quando proclamo por igualdade entre as pessoas. Não entendo porque distinguirem-se as pessoas pelos cargos, pelo dinheiro que uns têm mais que os outros. As diferenças, aqui, ao contrário, se mostram num princípio de superioridade artificial, onde cargos e matéria determinam a anfitrialidade piegas e a concepção de dominação é realçada. Por minha profunda divergência com essa visão é que me bloqueia. É o descompasso que tanto falo.

Eu queria tanto transcender o feudalismo.

Mas – enfim – descubro-me como Frida, só que morando em Santiago vou continuar atolado do feudo.

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